quinta-feira, 15 de setembro de 2011

EXPOINTER (edição revisada)}


   É a festa maior dos gaúchos, preparam-se um ano para o evento, uns se preocupam na apresentação dos animais de suas cabanhas, outros para a noite.
    Na década de setenta, a turma da fronteira reunia-se por cidades e associação de criadores e eram considerados os reis da noite.  Os criadores da cidade de Guaçú Boi, (entre Itaqui e Uruguaiana) se juntavam a arrozeiros e davam as cartas nas noites porto alegrenses, quando as luzes  se acendiam.
     A Expointer durava duas semanas, vinham com famílias, às esposas retornavam em seguida e os “abandonados”, soltavam-se.  Em certas casas eram chamados de Gauchinhos de Ouro, pelos garçons e garotas, pois eram grandes gastadores.
     Numa noite festiva, foram ao Gruta Azul, Gordo, Gringo, Messias e Barroso, mesa farta em bebidas e bem acompanhados, quando passam dois amigos de uma cidade vizinha acompanhados de mulheres formais.
     Gordo o mais afoito do grupo, lascou: - tchê larguem estas feias e passem para a nossa mesa, só tem princesas lá. São as nossas esposas responderam.
 Foi um tiro no pé do atrevido. Não bastou aquilo, uma delas olhou-o e fulminou: - não te lembras de mim, que fui colega da Marfisa, tua esposa na faculdade em Santa Maria.
 Depois do tiro, aquela flechada certeira no coração. Gordo ficou pálido, vermelho, suando, tonto e só queria desaparecer.
    Pagou a conta e se mandou.
Na volta a Guaçú Boi, contou o acontecido aos amigos, mas ficou devendo como foi o acerto final com a Marfisa.
   Antes as casas noturnas propagavam apresentações de bailarinas argentinas, garotas Streep tease, com farta publicidade, hoje mudaram o foco, divulgam o nome de chefes e os serviços de cozinha internacional.
Os tempos mudaram, ou os festeiros envelheceram?



O Machão da Fronteira

                                 
                                                                                    Colaboração do amigo Hervê Pasquotto Saciloto *
      Uns profundos sulcos verticais entre as fartas sobrancelhas eriçadas, olhos faiscantes, grandes maxilares rígidos, um metro e noventa de altura, voz grossa, firme e aqueles bigodes pretos fazem de Inocêncio um gaúcho típico da fronteira do Rio Grande do Sul com a Argentina, Ainda mais quando calça as botas pretas de pelica, veste as bombachas largas de gabardine, toda pregueada nas laterais, presa na cintura por uma guaiaca feita por artesãos da região, com a camisa branca de mangas compridas, arregaçadas até a metade dos braços e lenço vermelho ao redor do pescoço, amarrado com um nó caprichado que aprendeu com o avô.
      É conhecido como o maior “pão duro” da fronteira; basta dizer que, em dois anos, triplicou a área de vinte quadras de campo que herdou do avô, morto por três tiros de revolver na sua última briga, em uma festa do Divino na igreja da Vila.
      Machão corajoso e fanfarrão. Nada amedrontava o Inocêncio a não ser o sexo oposto Ao se aproximar de uma mulher treme dos pés à cabeça. Para compensar esta fraqueza, vive mentindo aos amigos.  No bolicho à beira da estrada, onde as pessoas se aglomeram para jogarem tava ou bochas, conta em voz alta, para que todos ouçam dezenas de casos amorosos que jamais aconteceram 
       Certo dia, uma prostituta da capital, de passagem pela região, sentada em silêncio, ouvia as gabolices de Inocêncio, sem ser percebida pelo grupo, absorto nas mentiras que fluíam da boca do machão.
       A mulher, uma morena alta, cintura fina e lindas pernas, olhos castanhos e cabelos pretos caídos nos ombros, em certo momento, após avaliar com precisão a personalidade do líder do grupo resolve fisgá-lo, com a esperteza e a experiência que aprendeu durante os longos anos vividos na escola da vida
       Levanta, caminha de vagar, balançando o corpo com harmonia de uma modelo desfilando na passarela. Aproxima-se de uma roseira repleta de rosas vermelhas. Pára. Disfarça interesse pela beleza das flores. Logo que percebe o silêncio na cancha de bochas, olha por cima do ombro esquerdo, encara o grupo extasiado com sua beleza e encontra os olhos amedrontados do Inocêncio que busca uma estratégia para sumir do local. Ri com delicadeza, e sem palavras, apenas gesticula. Um dos homens surpreso capta a mensagem. “Você é mesmo um cara de sorte. É para ti, Inocêncio! Vai lá”.
       Completamente paralisado, Inocêncio procura, aflito uma saída. Fugir seria a sua ruína de macho. Olha para o grupo e percebe que precisa decidir o que fazer. Encaminha-se quase cambaleando em direção à mulher, que o recebe sorrindo. Com um gesto pede que se aproxime um pouco mais. Levanta-se na ponta dos pés, encosta a boca na orelha de Inocêncio e fala baixinho por alguns segundos.
       Os dois saem pelo portão da frente do bolicho, sob os olhares curiosos dos amigos.
       Hoje, casados, junto com seus dois filhos, continuam freqüentando o local sob a curiosidade dos amigos que jamais souberam o que disse a mulher no ouvido de Inocêncio.
                                              
  • Agro-Técnico da ETA
  • Geólogo da Petrobras
  • De Santiago do Boqueirão

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Acampamento Farroupilha

    Finalmente parece que a chuva deu uma trégua. O pessoal do arroz está com as barragens cheias e precisando preparar a terra. O Instituo Coussirat Araujo, anuncia breve a volta de mais água.
     No bonito e ensolarado domingo, devidamente pilchado foi cumprir meu dever cívico de gaúcho. Fui churrasquear com um grupo de companheiros do Rotary Bom Fim, no “Piquete Gaúcho Grito da Liberdade”, do companheiro Mota, índio criado no pampa do Bagé, entendido nas tradições campeiras.
    O Acampamento Farroupilha, deve ter mais trezentos galpões crioulos de fogo de chão, vejam que fumaça estava aquilo lá.
    Dei uma passeada pelas ruas do acampamento, visitei a Casa do Alegrete, CTG do Grêmio e outros, num às 11 horas já tinha bailanta, com um aviso, “Proibido uso de faca no ambiente de dança”. Com aquele aviso, coloquei minha adaga no cano da bota, mas não encontrei nenhuma prenda desacompanhada, era um baile familiar.
   Visitei o Galpão dos Lanceiros Negros, que cultuam os negros guerreiros da Revolução Farroupilha, das tropas de Canabarro, covardemente assinados numa emboscada. A história registra que foram levados ao local pelos próprios companheiros.
     Todas as grandes empresas locais, multinacionais, meios de comunicação e repartições públicas, montam galpões para seus funcionários. O acampamento fica vinte dias abertos ao público, com muitas lojas gaúchas e churrascarias.
     Voltei ao galpão do Mota corria muita lingüiça e costela gorda para os presentes ao som do “Conjunto Gaudério Luiz Américo”, com muita rancheira e chamamé. Na hora do “Canto Alegretense”, ajudei os viventes na cantoria. Foi uma tarde especial, para quem tem raízes na campanha gaúcha.  Voltando pra casa, me senti o próprio gaudério defumado.

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Mais umas do Incrível tio Xiruca

  O filho Sério saiu do exército e  animou a fazer os exames recomendados. Pediu a Flor fritar duas galinhas na farofa. Em Cachoeira tomaram o trem partiram à desconhecida Porto Alegre.
   Na estação, o parente Mirinho, que ele chamava de Medicina, esperava-os, foram ao Grande Hotel, saia na porta o general Flores da Cunha, ele como “Chimango”, foi abraçar o caudilho que indiferente nem tirou o charuto da boca.  O porteiro fardado de branco e quepe, gentilmente apanhou as malas, mostrando a porta giratória. Não houve proposta para entrar, pois não ficaria engaiolado naquela geringonça.  
   Partiram ao Hotel Majestic, lá deu tudo certo, estavam pilchados e avisaram que nas refeições tinham que se apresentar de terno. Com Mirinho foram ao Guaspari e se vestiram, já pensando no futuro casamento do Sério.
   No jantar, todos formais tomaram mesa, o garçom iniciou os serviços, entre os pratos tinha galinha. Comeu a ave com a mão e jogava os ossos pela janela, quando foi avisado que estava fechada. Era um velho hábito que tinha em casa, nas janelas sem vidros, jogava os restos paro os cachorros.
   No outro dia consultou com o Professor Oscar, fez os exames e com os resultados, recebeu os remédios e conselhos, estava com altas taxas prejudiciais no sangue e o conselho para não fumar mais, pois estava com os pulmões comprometidos.
   Cinco dias se passaram, marcou a volta, deu mais uma passeada pela cidade, tomou sorvete e picolé pela primeira vez. Gostou de mais. Como ia viajar aquela noite, comprou vários picolés, mandou enrolar. O atendente alertou-o, para não deixar apanhar sol, não tem perigo, vou levar com muito cuidado, respondeu. No hotel colocou os picolés na mala de garupa e deixou no quarto, foi acertar as contas e ao voltar para apanhar a mala, ficou indignado, tinham comido os picolés, “mijado” na mala, deixando só os pauzinhos, contava ele.
  Em a casa, contou da consulta e que estava com o sangue grosso, não poderia comer carne gorda, nem charque muito salgado e proibido de pitar, o cigarro estava fazendo muito mal.
   Fez uma festança no casório do Sério, mandou convite para os fazendeiros e dizia os pobres não precisam de convites, pois virão pelo cheiro do churrasco. Certa hora, mandou a gaita parar e disse: -vamos todos dormir, pois os noivos já estão se “reborqueando” na cama e nós aqui feitos bobos.
    Tornou-se conhecido e fonte de muitos causos na família. Eram comuns nos serões os mais velhos, contarem as proezas do tio Xiruca, mas no meio de tantas confusões, sempre foi muito vivo nos seus negócios e deixou um bom pé de meia para a família.